sábado, 2 de maio de 2009

CARTA PARA MEU VÔ

Marcos Seiter
Vô, vejo o senhor com a minha vó. Ali no pátio de meu tio, seu filho, Filomeno. O senhor visitava-nos. Vindo de Santo Augusto. Interior do Rio Grande do Sul.
O céu estava fechado naquele dia com nuvens cinzas. O João-de-barro que morava na árvore que foi derrubada(que lhe protegia dos raios-ultravioletas do sol), do pátio em que o senhor estava, observava o senhor como eu, com os olhos centrados.
O senhor usava um chapéu-de-palha, vestia uma camisa branca social de manga curta e uma calça bege. Não lembro se estavas de chinelo ou de sapato. E mastigava (minha mãe revelou-me dias antes de o senhor chegar, que costumes tinhas), como de praxe, seu charuto entre os dentes. Sua boca era pequena. Seus lábios quase sumiam diante de seu rosto. Assim como são os meus. (Lembro dos seus, pelo sorriso do senhor.) Eu olhava para os dentes do senhor e para as suas unhas, via-os amarelados. Eu deveria querer mastigá-los também. Eu queria ver os meus dentes de poucos anos, minhas mãos de poucos anos, amarelados também. Não podia tê-los. O fumo de hoje é o melhor consumidor de dentes, de mãos, de pulmões, de todos os órgãos humano. A Cuba não é o Brasil, vô. Onde o principal fumo é o charuto. Que peninha eu tenho do Brasil.
Vô, a minha vó, sua mulher, acompanhava o senhor. Ela estava de vestido azul. A decoração do mesmo era desenhos de flores brancas, com tons de diversas cores. Era o vestido que ela adorava usar. Lembro que muito subia e descia a lomba da Rua Sargento Vitório com o mesmo.
Hoje, se o senhor estivesse vivo, estaria completando 106 anos.
Sempre lembro do senhor com muito afeto. O ambiente que descrevi aqui, é o que está vivo em minha memória. Desde muitos anos atrás. Quando nem falava direito. Quando nem sabia o que era vida. Quando nem sabia que estaria aqui escrevendo o que eu sinto pelo senhor: amor.
Vô, esteja com Deus.

3 comentários:

Kari disse...

Que linda declaração!
Se ele pudesse ler, tenho certeza que ficaria emocionado.


Beijão

Unknown disse...

Concordo com Kari, se ele pudesse ler, ficaria muito, mas muito feliz. Meus sentimentos.

Ragas disse...

Bem legal essa declaração. Na verdade, eu acredito que ele possa ler o que escreveu, palavras são muito poderosas para ficarem presas nesse nosso pedacinho do universo.

Abrazzo Ragazzo