segunda-feira, 18 de abril de 2011

Conto da Playboy

Não faz muito tempo que li esse conto da Fernanda Young.

Um conto erótico. Perfeito.

Espero que gostem.

Um Conto De Natal

A escritora e mulher sensual Fernanda Young, capa da PLAYBOY de novembro de 2009, aceitou nosso desafio e escreveu sua primeira narrativa curta. Com texto ácido, bem-humorado e deliciosamente erótico, ela prova que tamanho não é documento.


Ele era o tipo de homem que lê o conto da revista de mulher pelada, ou seja, um punheteiro sensível. Ela era o tipo de mulher que sonha em conhecer homens na banca de jornais no sábado de manhã, ou seja, uma solitária iludida. Feitos um para o outro, foi assim que se encontraram – folheando revistas lado a lado.

Ela, uma de decoração, pois sugere bom gosto e planos para um lar. Apresentaram-se, ambos milimetricamente tímidos: Luiz Sergio e Fabíola. Já ali, naquele primeiro instante, sabiam que iam transar. Chegaram mesmo – enquanto falavam coisas que não vale a pena contar – a se imaginar na cama. Um certo tipo de pecado, já que era antes de meio-dia e véspera de Natal. E ninguém ousa pensar em trepar com desconhecidos em plena luz do dia e diante do espírito natalino.

– Vai passar onde?
– Na casa dos meus pais. E você?
– Também. Um saco.
– Um saco.

Outra coisa a ser evitada: falar em saco querendo dizer saco diante de mil papais noéis com seus sacos. Deveriam rir da ironia? Acharam que não por motivos diferentes. Ele não confia em seu hálito assim tão de perto. Ela não gosta da própria risada, acha-a nervosa.

– Podemos nos encontrar depois.
- Depois da meia-noite?
- É.

Para trocar reclamações. Enfim puderam rir. Levados por esse alívio momentâneo, combinaram de se encontrar ali mesmo na banca de jornais. Quem chegasse primeiro esperaria o outro. Nem trocaram celulares para não estragar a magia; parecia coisa de filme com Tom Hanks e Meg Ryan. Pagaram suas revistas e se despediram risonhos. Nunca haviam se sentido tão felizes quanto nas horas seguintes, durante as quais anteciparam cada detalhe do que estava por acontecer.

Luiz Sergio imaginou que a vagina dela seria daquelas para dentro que você precisa lamber para encontrar a passagem. Fabíola previu um sexo aos solavancos bem lambuzado e fazendo barulho de pé afundando na lama. Ele bateu duas punhetas no chuveiro antes de se vestir com a melhor roupa: camisa social azul fresquinha, blazer Armani, calça cáqui americana, mocassim com franjinha. Ela se masturbou com o vibrador, mesmo com as pilhas falhando, assim que chegou em casa.

Tomou um banho revigorante, depilou-se com cuidado e experimentou todas as roupas até achar a perfeita: vestido Adria na Barra, lindo, leve, que a deixou com cara de mulher bem resolvida. Durante a ceia, eles comeram pouco para não pesar no estômago. Evitaram brigar com os pais para não estragar o clima. Não o clima natalino, o clima de sexo. Pensaram em sexo a noite inteira – em como chupariam, como enfiariam, como gozariam. Sentiam-se presenteados.

Tão almas gêmeas que utilizaram palitos de dentes superparecidos para tirar farof as superparecidas presas entre dentes iguaizinhos. Mal deu meia-noite, e já estavam beijando os pais e indo embora “morrendo de sono”. Ela quase se desesperou quando descobriu que haviam prendido seu carro na garagem. Berrou no interfone pelo porteiro, que abandonou os filhos sozinhos para manobrar a saída. Ele chegou à banca à meia-noite e 14, e estava vazia.

Ficou no carro esperando para fingir que estava chegando um pouco antes dela. E foi assaltado por dois manos em uma moto que levaram o carro com ele pulando para o banco de trás sob a mira de um revólver enferrujado. – Não me mate, por favor. É Natal. Fabíola chegou à banca à meianoite e 23. Esperou ansiosa até 10 para a 1, quando começou a desconfiar que ele não viesse. Lá pelas 20 para as 2, ela começou a chorar. Já não estava na banca, estava sentada no meio-fio da rua, próximo a seu carro.

A mocinha que trabalha na banca chegou a ir até lá para falar com ela e perguntar se estava tudo bem. Ela disse que sim, entrou no carro e foi para casa. Nunca mais acreditaria em contos de Natal. Luiz Sergio ficou sem o carro, mas o seguro cobriu – e ele ganhou uma ótima história. Fabíola resolveu passar o Réveillon em Salvador, deu para um mulatão e pegou uma coceira desagradável.

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