sábado, 7 de março de 2009

FIDELIDADES

Arte de Paul Klee

Marcos Seiter




Não canso de ser fiel comigo.

Corto minhas unhas quando estão grandes. Se desesperam por eu não dar a devida atenção a elas, quando curtas, quase escondidas nos dedos. Resolvem então aparecer com tamanha rebelião que as vezes umas ficam encravadas nos cantos dos meus dedos. Minhas unhas agora são até decoradas de esmalte preto. Por enquanto é só preto.

Rapo meu cabelo quando os fios começam a formar o desenho da minha cabeça. Não gosto. Fico incomodado. Eles não tem como impedir o meu desejo de ignorá-los com a máquina zero. Gosto da originalidade. Espero que eles me perdoem por eu generalizar.

Quando os primeiros fios da minha barba aparecem, preocupo-me em fazê-las ou deixá-las crescerem e modelarem o meu rosto. É uma franqueza. É uma igualdade de interesses. No início de sua aparição em meu rosto, eu a ignorava, como se estivesse frente a frente com o espelho. Mas com o passar do tempo dei, e ando dando, o devido valor.

Meus olhos se cobrem com as imagens das estruturas de Porto Alegre. Dispenso óculos escuros. Desde que me vejo com meus olhos, nunca gostei de usar óculos de sombra. Os oculistas devem me odiar por isso.

A minha sobrancelha sobra em meu rosto. Ela é escura diante de meu clarão. As pessoas que não me veem há tempos, devem me reconhecer por ela. Ela é uma das minhas identidades. Ela recebeu meu respeito.

O meu andar é míúdo. A maioria das vezes com a cabeça para baixo. Os meus passos me acompanham. É a minha companhia mais sincera da maior parte da minha vida. O caminho não é invertido como as placas de ruas. É um só.

Aprendi a ser fiel comigo. Ser eu. Não seguir rumos iguais. Melhor do que aprender, deixei a vida me levar como o vento. Que viaja por todos os continentes. Deixei como o cantar dos passáros, que harmonizam o ambiente silencioso, como num parque, diante das árvores mudas pela não presença do vento sobre suas cabeleiras. Folhas. A solidão é inexistente com o cantar. Aprendi a viver a vida diante dos céus azuis ou escuros do dia.

Não canso de ser fiel comigo. Minha alma agradece por eu pintá-la.

Pintá-las com as verdadeiras expressões do meu eu. É como o Retrato de um menino de Paul Klee.

Sou um menino diante duma roda gigante.

6 comentários:

Kari disse...

Confesso que li a última frase antes de tudo... E, ao começar a ler, imaginei um menino em frente a roda gigante... Percorri o texto, enquanto caminhava os olhos pela roda que girava... Me senti num parque, a noite, pequena, perdida em lembranças...
Desculpa, me perdi...

Mas sabe, é tão bom quando somos fiéis... Fiéis ao que acreditamos, ao que seguimos, a quem queremos... Porque, mesmo que tantos critiquem, eu acho a fidelidade fundamental, principalmente aquela que diz respeito a nós mesmos...

Beijos

Cadinho RoCo disse...

Pra ser é preciso ser.
Cadinho RoCo

Camila disse...

Ai MArco, sempre te achei autentico (mesmo conhecendo pouco sobre ti) mas depois deste texto tenho certeza que estou certa.

Autentico é um otimo adjetivo pra vocë.

Um beijO

Pripa Pontes disse...

Oi, Marco! Quanto tempo, heim? Pois é, aparecí. Tava sumida, e sentindo falta do universo de letras e reflexões que a blogosfera porporciona àqueles que a desbravam...

Autenticidade, é tão bela essa palavra...dar vazão ao seu próprio sentimento, ser o que se sente, e não o que se convenciona que deve-se ser. Não há melhor remédio para a leveza do corpo e do espírito. É a garantia de tranquilidade, sabendo que se é fiel às próprias convicções.
Ser fiel a si, ser livre!

Ótimo post, ótima reflexão!

Bjos.

[ rod ] ® disse...

Mesmo sem querer o tempo é fiel a nossa vida. Fugimos, por vezes, da nossa condição e no fim, velhos ou não, trilhamos a nossa inquestionável trajetória.

Bela escrita meu caro,






Novo Dogma:
reiNo...


dogMas...
dos atos, fatos e mitos...

http://do-gmas.blogspot.com/

Nanda Nascimento disse...

É muito bom viver da maneira que achamos melhor. Desenhando nossa vida, respeitando nossa história de maneira alegre e verdadeira.

P.s: Já coloquei o resultado do meme.

Beijos e flores!